Inominável

O que eu sinto por você não tem nome. Ou talvez o que eu sinto fosse melhor descrito como a dor que entrelaça minhas veias e arde, fazendo com que meu coração bata na mesma velocidade que os passos de uma dançarina no carnaval da Sapucaí.

Tudo em mim modifica perante ao meu sentimento. Você me modificou. A intensidade de tudo e a efemeridade de tudo sacudiu todos os meus ossos e me desalinhou por completo. Remontar-me é uma competição contra o tempo em cronometra-se os segundos até que eu me perca novamente da sensatez, que esvazia-se com seus olhos que envergonham qualquer paleta azul que possa existir. Ou com o gosto do seu beijo que me fareja a quilômetros de distância.

Não que faça-se preciso. A única necessidade que eu almejo é a vivacidade traçada por nós.

Átimo

Eu queria que várias vidas contivessem dentro da minha. Ou ao menos alguns capítulos a mais de uma juventude que passa voando que quase me perco com o assoprar das velas. Queria poder ser tudo, vivenciar tudo, sem essa pressa que devora desesperadamente trazendo a sensação de que não há tempo suficiente para contemplar cada detalhe que passaria despercebido se não fosse visto com atenção. São infinitos os lugares, bairros, ruas, pessoas, trejeitos, características, perspectivas, sabores, odores e singularidades e uma rapidez constante que apenas um eu elevado a milhões poderia dar conta de tudo. O passar do tempo e o uso dele é uma contagem regressiva para um gran finale que simplifica-se em um maniqueísmo oportuno: é algo desastrosamente ruim ou sensacionalmente bom. E sem segundas chances.

 

Trilha sonora de abril

Que saudade eu estava de fazer trilha sonora do mês! Dessa vez de abril! É impressão minha ou esse ano tá passando muito rápido? Quando eu era mais nova e ouvia essa lenga-lenga achava que era papo de tio, mas sinto que conforme envelheço, os anos passam mais rápido. Digressões a parte, e para variar, abril foi um mês muito eclético… tem música para todos os gostos e momentos. Espero que gostem! Aproveitem!

5h48m

A luz vinda do amanhecer vaga suave entre o quarto, ofuscada pela cortina semi-aberta que voa com a brisa vinda das árvores da pequena ruazinha de grandes árvores que chegam até o terceiro andar. O cômodo ocupado por uma cama, prateleiras, um armário e duas pessoas traziam muito mais que um belo raiar do sol. A maciez dos sentimentos contidos naquele interior acetinavam as mazelas dos que ali já sentiram. A exterioriedade de algo tão sublime transcendia o que havia de mais bonito e coloria, como os raios que pintavam o céu, todo o resto.

Limbo

Nos seus ombros miúdos faltava-lhe energia e nos seus olhos, brilho. Caminhava numa antropoformização de gente com burro de carga no final da noite, cansado, com sede, faminto e sem propósito. Seu sorriso era exausto e escondia um passado que não gostava de lembrar e envergonhava-se da importância que ele tivera no resto de sua vida solitária. Não era casada, não tinha filhos ou um emprego permanente. Não por opção. O seu nome não era recordado por quase ninguém, mas poderia bem chamar-se Macabéa. De pele opaca, rugas nos olhos e aparência cansada, arrastava-se pelos corredores de uma vida, buscando um sentido que nunca encontraria.

Irrupção

As doses homeopáticas de amor encurralam-se em uma ruína devastada e que sustenta-se aos trancos e barrancos por dois frágeis pilares em um morro afastado. Enquanto os soldados, verdes, cobertos e ariscos forçam a entrada para se apossar de mais uma relíquia que permanecera praticamente intocada.

Tudo que um dia havia existido desmoronava sem deixar resquícios de existência ou que havia sido motivo de contemplação pelos visitantes que passaram por lá. As que restavam, nos cantos e indefesas, tentavam reencontrar, em meio a poeira da devastação, um pouco de oxigênio para respirar e encher seus pulmões enquanto tomavam espaço e, pacientemente, reconstruíam-se a tempo da próxima marcha subir a colina.

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